quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Cuidado ao se comunicar em português


No curso preparatório de ingresso à magistratura, o professor insiste na necessidade de que os escritos sejam claros, objetivos e não empolados. No final da aula, para descontrair, pergunta aos alunos se eles sabem a diferença entre o ´tu´ e o ´você´. Há muitas respostas, nenhuma delas exatamente a desejada pelo professor.

Este, então, exemplifica bem a diferença: o diretor geral de um grande banco está preocupado com um jovem e brilhante diretor, de formação jurídica, que depois de ter trabalhado durante algum tempo junto dele, sem parar nem para almoçar, começa a ausentar-se ao meio-dia, celular desligado, vários dias da semana. O banqueiro chama um detetive privado do banco e diz-lhe: -"Siga o diretor fulano durante cinco dias úteis... quero ter certeza de que ele não anda fazendo algo sujo".

O detetive, após cumprir o que lhe havia sido pedido, volta e informa: -"O diretor fulano sai normalmente ao meio-dia, pega seu carro, vai à sua casa almoçar, fica fechado mais de uma hora com sua mulher, fuma um dos seus excelentes charutos cubanos e regressa ao trabalho". O banqueiro então se tranquiliza: -"Ah, bom, assim. Não há nada de mal nisso".

Logo em seguida, o detetive, querendo fazer se entender melhor, pergunta: -"Desculpe. Posso tratá-lo por tu"? -"Sim, claro" - responde o banqueiro um tanto constrangido. -"Bom então vou repetir" - diz o detetive. Vem, então, a frase reveladora: -"O diretor fulano sai normalmente ao meio-dia, pega teu carro, vai à tua casa almoçar, fica fechado mais de uma hora com tua mulher, fuma um dos teus excelentes charutos cubanos e regressa ao trabalho. É assim"!..

☺ Resumo da ópera: a língua portuguesa é muito traiçoeira.  Veja mais sobre o assunto no texto abaixo.

A confusão entre tu e você

A conjugação verbal do modo imperativo no português moderno, às vezes, incomoda quem conhece a gramática tradicional, principalmente quanto se trata do uso de tu e você. Por exemplo: lê ou leia? Você quer saber bem o assunto, então leia este livro. Usou o tratamento você (3.ª pessoa) e o verbo ler ficou leia (3.ª pessoa do modo imperativo). Houve uniformidade de tratamento. Ou então: Tu queres saber o assunto, então lê este livro. Usou o tratamento tu (2.ª pessoa) e o verbo ler ficou lê (2.ª pessoa do modo imperativo). Houve uniformidade de tratamento. Você quer saber bem o assunto, então lê este livro. Usou o tratamento você (3.ª pessoa) e o verbo ler ficou lê (2.ª pessoa, tu). Não houve uniformidade de tratamento. Isso não é tolerado pela gramática tradicional.

O português moderno permite que se escolha livremente entre tratá-lo por tu ou por você. Nas gramáticas tradicionais, são duas formas igualmente corretas para tratar a segunda pessoa do discurso: 1.ª pessoa: quem fala (eu-nós)/ 2.ª pessoa: com quem se fala (tu-vós, você-vocês)/ 3.ª: de quem se fala (ele-eles, ela-elas). Embora tu e você se refiram à segunda pessoa do discurso, tu pertence à 2.ª e você pertence à 3.ª pessoa gramatical, exigindo as formas verbais e os pronomes respectivos.

Mas o rumo evolutivo da língua aponta a supremacia absoluta do você e a retirada de cena de tu/vós. A conjugação verbal se reduzirá a quatro pessoas: eu, ele, você; nós, eles, vocês. Para fazer um convite, uma exortação, ou dar uma ordem usa-se o imperativo, mas no português moderno misturam-se imperativo e subjuntivo. Veja a antiga propaganda da Caixa Econômica Federal "Vem pra Caixa você também!". Vem é o tu do imperativo. Para haver uniformidade, deveria ser "Venha pra Caixa você também!" Imperativo afirmativo: (não há 1.ª pessoa do singular), vem tu, venha você, venhamos nós, vinde vós, venham vocês. Daí a frase "Ou você se atualiza ou a concorrência te engole..." ser legítima no português popular e no apelo publicitário, mas afronta a gramática tradicional. Fonte: Por Trás das Letras (conteudo@algosobre.com.br)

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