Crônica de Mauro Mello (*), no blog da Table Partners (24.abr.11), sobre o livro "Effectual Entrepreneurship"
Em outros artigos já descrevemos o ensino de empreendedorismo em Wharton (Universidade da Pennsylvania), absolutamente inovador na época em que foi lançado, porque baseia-se no entendimento de como empreendedores reais pensam e fazem negócios que dão certo. Recentemente um novo grupo de pesquisadores, ligados principalmente ao IMD (Suiça) e à Darden School (Universidade da Virgínia) avançaram e sistematizaram ainda mais o entendimento de como empresários de sucesso empreendem. Esse conhecimento novo está agora publicado no livro “Effectual Entrepreneurship“ (de autoria de Stuart Read, Saras Sarasvathy, Nick Dew, Robert Wiltbank e Anne-Valrie Ohlsson)
Criando o idioma do empreendedorismo - Um aspecto interessante deste livro é que ele claramente é escrito para um leitor com as características de empreendedores da vida real: práticos, objetivos, apressados, impacientes com teorias e textos que exijam um span de atenção (**) muito prolongado. O texto é ágil e obsessivo com objetividade. Falando em linguagem, parte do mérito dos autores é começar a criar um idioma do empreendedorismo. Como disse Lavoisier, “para invocar um conceito novo é necessária uma palavra”.
Quem sou, o que conheço, quem conheço - Entre vários conceitos novos, os autores enfatizam quatro “Princípios” que descrevem a forma de pensar característica de empreendedores de sucesso:
- Princípio do pássaro-na-mão. Ao invés de buscar e selecionar oportunidades e de esperar as condições ideais para implementá-las, os empreendedores de sucesso começam com o que têm na mão: quem são (exemplo: o que desejam e gostam de fazer), o que conhecem (sua experiência, seu know-how) e quem conhecem (que suporte e que stakeholders podem solicitar e começar a alinhar imediatamente).
- Princípio da co-criação do negócio. Para alinhar e aumentar progressivamente o compromisso do maior número possível de stakeholders do novo negócio – investidores, sócios, clientes, distribuidores etc. empreendedores de sucesso abrem mão de definirem sozinhos o novo negócio/produto/mercado. Compartilhando sua criação com os stakeholders, obtêm deles suporte e comprometimento com o projeto.
- Princípio da perda permissível. Tipicamente o empreendedor de sucesso concentra-se em saber e em administrar o montante máximo que pode perder, caso sua iniciativa não tenha sucesso – o que, estatisitcamente falando, é o cenário mais provável de qualquer iniciativa. Análises como Fluxo de Caixa Descontado ou payback dependem de estimativas de 'resultados esperados' que, realisticamente falando, não são esperados – mesmo negócios que dão certo costumam seguir caminhos completamente diferentes daqueles imaginados na fase de start-up. Saber e limitar o quanto pode perder e alavancar criativamente os recursos limitados que possui é a habilidade central do empreendedor de sucesso.
- Princípio da limonada. Tanto o anedotário de negócios como a pesquisa acadêmica indicam que a grande maioria dos negócios bem sucedidos nasceram de projetos/conceitos completamente diferentes dos que acabaram resultando. Os empreendedores de sucesso são aqueles que, apesar de perseverantes e apaixonados por seus projetos, são capazes manter a flexibilidade e acolher as surpresas e imprevistos, incorporando-as ao projeto e ajustando os objetivos do projeto. Para o administrador surpresas são más notícias; para o empreendedor surpresas podem ser o caminho para oportunidades diferentes da original, que podem levar ao sucesso. Empreendedores alavancam os imprevistos.
O pulo do gato - O que os quatro princípios acima refletem, na prática, é uma diferença fundamental de atitude em relação a fazer coisas no mundo. A maioria dos gestores entende – corretamente – seu papel como sendo o de definir objetivos, entender os meios necessários para chegar lá, obter esses meios e, de maneira disciplinada, empregar os meios até atingir os objetivos.
Empreendedores de sucesso, quando visualizam um objetivo, seguem a direção oposta: pensam em como os recursos que já têm em mãos (capital, conhecimento, relacionamentos) podem ser usados da melhor maneira possível para progredir em direção ao objetivo – ainda que sem verem claramente como poderão chegar ao objetivo final apenas com os recursos atuais!
Na maioria das situações de negócio, especialmente nas grandes empresas, o pensamento do gestor funciona muito bem. Onde a abordagem “gerencial” não funciona é na hora de criar novos negócios, lançar produtos completamente novos, entrar em mercados desconhecidos, etc. Nestas ocasiões, o pensamento empreendedor costuma dar mais certo e, quando não dá, as perdas são menores.
(*) Mauro têm estado à frente de empresas de consultoria há mais de 20 anos, apoiando empresários a exercerem lideranças saudáveis e propiciadoras de sucesso para suas organizações. Antes de fundar a Table Partners, Mauro foi consultor da Booz-Allen & Hamilton e da Gemini Consulting e fundador da K2 Achievements, um case nacional de sucesso num mercado dominado por empresas internacionais. Mauro foi executivo de empresas como Liberty Mutual, Esso e Monsanto e, através da K2 Participações, atuou no conselho de administração de empresas como Direkt Marketing Direto e Atrium Telecom. Engenheiro Civil (IME/RJ) e mestre em Matemática, Mauro é certificado no Myers-Briggs Type Indicator (MBTI) pelo Center for Application of Psychological Type (USA). Suas áreas de interesse e pesquisa incluem: técnicas de melhoria da dinâmica de times de liderança; modelos de governança de empresas familiares na terceira geração e uso do modelo de gestão das empresas controladas por fundos de private equity para outros tipos de organizações. Mauro tem 48 anos, duas filhas e está se acostumando com a idéia de digitalizar seus 4 mil livros e abrir mão de sua biblioteca. É editor da coluna "Leituras Que Funcionam", no blog da Table Partners.
(**) É o tempo que uma pessoa consegue se manter concentrada na tarefa que está fazendo sem começar a se distrair.
(**) É o tempo que uma pessoa consegue se manter concentrada na tarefa que está fazendo sem começar a se distrair.
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