Ainda não saiu do papel, mas as estimativas de custo do trem de alta velocidade (TAV) Rio-São Paulo começaram em R$ 18 bilhões, pularam para R$ 33 bilhões e em 22 de abril deste ano foram ajustadas para R$ 49 bilhões (cerca de US$ 30,6 bilhões, ao câmbio atual). Como estamos carecas de saber, a transição do papel para a realidade em nosso país alavanca o valor orçado de modo significativo, de forma que falar em R$ 100 bilhões de reais (US$ 62,5 bilhões) depois de tudo pronto não é nenhuma heresia. Independentemente das discussões sobre melhor aplicação desta grana em projetos de educação e cultura, saúde e saneamento básico, é interessante compará-lo com a linha de trem que foi inaugurada na China em 2006, considerada a mais luxuosa do mundo, em um país cujo sistema de transportes conta com inúmeras linhas férreas, tanto convencionais como as para trens de alta velocidade.
Desde que a República da China foi fundada em 1911, vinha sendo um sonho interligar todas as províncias por um sistema nacional de estradas de ferro. Na virada para o século 21, o Tibete era a última província que permanecia sem conexão ferroviária por conta de enormes e insuperáveis obstáculos. Desde os anos 50 os engenheiros chineses tentavam vencer inúmeros desafios para implantar uma ferrovia que ligasse o Tibete, que se reuniam em três grupos de fatores: uma formidável barreira de montanhas; um solo instável que se alternava durante o ano entre pantanoso e congelado; e um frágil ecosistema.
Finalmente, em maio de 2006, foi concluída a ligação. A ferrovia Pequim – Lhasa (a capital do Tibete) tem 1.956 km e atravessa altas montanhas da cordilheira do Himalaia que se situam a 5.000 metros do nível do mar, numa viagem que dura três dias. Este trecho custou US$ 4,1 bilhões, obra pronta, tendo a sua construção sido finalizada um ano antes do previsto. Os operários tiveram que usar máscaras de oxigênio e câmaras pressurizadas para poder trabalhar. Sempre que possível a ferrovia passou em pistas elevadas para permitir a travessia dos animais em migração natural, dado que ela foi concebida com o objetivo de minimizar o impacto ambiental. Dos 1.956 km, quase 500 atravessam solos que ficam congelados no inverno e viram lama no verão. Imagine-se o processo de contração e expansão do material que ocorre em tal tipo de terreno e a tecnologia empregada - e que era desconhecida até então. E sobre esse tipo especial de solo foi construída uma ponte com 11,7 km de extensão Pela altitude em que trafega, os carros de passageiros têm que ser pressurizados como os aviões. Estimando-se dez composições para trafegar nesses 1.956 km, teriam sido dispendidos mais US$ 450 milhões no conjunto ferrovia/trem. Vamos exagerar, digamos que os trens custassem US$ 1 bilhão. Se isso for verdade, o custo dessa ferrovia chinesa teria ficado em US$ 5 bilhões.
Pois é... O projeto do trem-bala Rio-São Paulo, de 400 km de extensão e que atravessará a Serra das Araras numa altura de até 1.000 metros, custará DEZ vezes mais (estimativa no papel) que o trem chinês, que tem um traçado cinco vezes mais extenso e que atravessa montanhas cinco vezes mais altas. Em um data show ► clique aqui ◄ de autoria de Eddy Cheong, da ONG australiana World Huaren Federation, você verá fotos de uma viagem pela ferrovia, com muito texto explicativo, em inglês. Mas não é preciso saber inglês para entender a grandiosidade da obra. Ao final, é bem possível que você esteja pensando assim como eu: é aceitável tudo isso? Vamos tolerar que metam a mão na nossa grana mais uma vez? Foi preciso um helicóptero cair para que os podres aparecessem na grande imprensa e mais uma vez ficasse claro como essas obras são tocadas no Brasil. A festa vai continuar?
E se você estiver a fim de viajar pela China de trem, obtenha todas as dicas consultando este ► Guia para Iniciantes em Viagens de Trem na China ◄ (Colaboração de Raquel M.B.)
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